Minha casa tem um cheiro covarde, um perfume mofado,
Um misto de medo e de paralisia da fala
Como se o verbo gaguejasse antes mesmo do princípio do sopro.
As paredes acanhadas, estão cobertas de areia
Uma maresia cáustica e de claustrofobia servil
Nem as janelas conseguem comer um vento novo.
Tanto é de ontem, pouco resta de horizonte.
Minha casa tem olhos opacos, já amaldiçoados pelo tempo das horas
A cegueira avança a passos largos
Como um doença do corpo senil.
Carregada dos ossos, que latejam em noites de lua mínguante.
Veste o telhado e se mistura as ervas daninhas.
Parece que sempre é inverno, no chão lá de fora.
Meus pés machucados, beijam o frio.
Minha casa já foi abocanhada por gigantes de concreto com dentes afiados
Roubaram o sol do dia, e os vestígios poeirentos das estrelas cadentes.
Nada sobra de alimento, as rosas do meu jardim.
Elas já morreram em outras estações.
Só se esqueceram de deitar sobre suas esperas amendoadas.
Minha casa, que já foi minha
Hoje deserta, relegada a sorte de um abandono
De um descanso morno, de um escombro final.
Meus rejeitos, meus dejetos de pele.