Barata Cichetto
Deixei de ter medo dos meus monstruosos assombros,
E deitei-me nu e silencioso sobre perigosos escombros.
Banido e esquecido, qualquer lugar é bom de esquecer,
Ferido e perdido, qualquer terra é boa para se aquecer.
Chamei por erros minhas estrondosas experiências,
E em derrota converti as mais gloriosas desistências.
Latem cadelas na rua, uivam cachorros na vizinhança:
Calem a todos, e matem ao maldito cão da esperança.
Bebam comigo um café amargo com gosto de serragem,
E saúde aos que ficam, à minha semelhança e imagem.
O que esperam do futuro, crianças do crime supremo?
Não atendam o celular, que pensar é perigo e extremo.
Acordaram tarde demais, e agora não existe o diferente,
Pintaram o céu de vermelho, cor preferida do presidente.
Deixem suas culpas apodrecerem debaixo da cobertor,
Tapem as narinas, que o mau cheiro é do seu redentor.
Deixei ela chegar, a única a comigo sofrer de saudade,
E se não resisto é pela dor de saber o que é a maldade.
Carne sobre meus ossos não há quase nem a sombra,
A morte é o que me consola e não o que me assombra.
Que sejam malditos enquanto durar sua descendência,
E todos que me fizeram sangrar nessa inútil existência.
Sua herança a sua própria justiça, cega, surda e falha.
E a lembrança de minha carniça no campo de batalha.
17/11/2019
Do Livro: Memórias Arrependidas de Um Poeta Sem Pudor
Antologia Poética, de 1978 a 2024
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Barata Cichetto, 1958, Araraquara – SP, é poeta, escritor. Criador e Editor do Agulha.xyz e Livre Pensador.